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quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Palavras

pt.1

Eu queria ser palavras. Eu sei que palavras são o que já foi, mas queria sê-las. Queria expressar, queria mostrar, queria ser arte. Queria ser palavras vomitadas em um papel branco inexpressivo tomado por alguma graça. Palavras desenhadas em uma péssima grafia, saídas da ponta de uma caneta preta que também rabisca. Eu queria ser passado porque já não temos mais tempo. Se eu virar presente, mal acontecerei. Preferia já ter acontecido.


pt.2

Eu queria ser palavras. Mas só as queria ser por achar que não tínhamos muito tempo. A verdade é que talvez não tivéssemos tempo nenhum. Não era hora. Não era momento. Talvez eu até tenha virado palavras (mesmo não tendo acontecido). Talvez eu volte a me torná-las. Eu não fui passado, pode ser que eu não seja presente. Mas eu posso ser futuro. Este ainda não está escrito – nem pela minha letra torta, nem pela sua pouca arte – e ainda demora a ser traçado. Temos uns 70 dias até começarmos a achar meios de moldá-lo. E não interessa passado. Não interessa palavras. Interessa que, se eu for futuro, terei a vida toda a frente de mim para ser algo mais que letras espalhadas por uma folha em branco. Poderei ser mais que sete ou trinta dias. Posso ser futuro. Posso ser eterna.

- 2011

terça-feira, 22 de julho de 2014

A Parada, pt.2

Parei de pensar.

Mas os pensamentos não pararam de me procurar.
Por algum motivo, depois de tudo isso, depois desse tempo todo, tomamos caminhos contrários e andamos em círculos.
Voltamos para onde estávamos no começo.
Eu com meus pensamentos descabidos e você com seus pensamentos delirantes.

A diferença entre eu e você é que eu sei a hora de parar.
Você vai continuar girando e girando e tentando e prometendo nunca mais amar.
Não é assim que se faz, my dear.
Eu posso garantir. Eu já estive aí.
E, às vezes – perdoe-me o clichê –, é só parando que se consegue continuar.

Pare. Agora. Ou logo você vai estar aqui de novo, e depois aí, e de novo aqui... sempre reclamando que não tem um lugar para estar.
Se você parasse só um pouco de girar...

(mas pare só quando estiver perto de mim.)


- 2013

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Migalhas

De migalha em migalha,
a pessoa que lhe fala,
vai ficando puta.

De migalha em migalha,
farelo em farelo,
nada muda.

Migalha e migalha
do pão mais belo:
minha cura.

Você joga e eu pego
todos os restos.
Minha jura.


- 2013

segunda-feira, 9 de junho de 2014

A Parada.

Já faz alguns dias. "Alta noite já se ia...". Sirenes apitam, alarmes disparam, o mundo gira. O que parecia não ir além de uns pensamentos descabidos deságua no cimento da frente da nossa casa. A rua vazia, escura, sozinha na noite eu subia. Andava quietinha, mas nunca silenciaria o barulho da minha mente. E eu mentia. Mentia até não poder mais pra mim e pra quem quisesse perguntar. E as sirenes soavam, ao longe, me denunciavam aos montes. Sinal de alerta, esta vida não anda certa, é hora de parar.


E parei.


Parei de pensar.


- 2013

sábado, 12 de abril de 2014

Fim de Semana

Era um velho dia, quase terminado. Quase novo de novo. Eram passos solitários pela rua mal iluminada. Era o caminho até um prédio. Eram braços, abraços, fuga do frio. Era sono. Era claro de novo.
 
Era um jogo. Todos corriam. Ele gritava. Só não mais que todos os outros. Fim da partida. Volta para casa. Espera infinita. Ele liga. Veio me buscar. Quis dizer que eu não vivo sem ele – eu não quis concordar.

Era qualquer lugar. Éramos nós sentados em um sofá. Braços. Em todo lugar. Dou uma volta, faço um charme. Mas volto. Braços. Eles aqui, mas o pensamento longe. Segunda opção. Aquela que você escolhe depois de vários goles e ninguém que se encaixe no posto de ‘pessoa perfeita’ – então que seja a segunda melhor. Ou a terceira. Ou a última.

Era segunda. E fim de história. 


- 2011