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sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Os quatro gasosos

Se não me engano, é lá pela segunda série que começamos a aprender sobre o sistema solar na escola. Enquanto os colegas sequer sabiam que planeta vinha antes da Terra na escala de proximidade do Sol, eu já sabia que formatos as galáxias podiam ter, o que acontecia quando uma estrela virava supernova e por que buracos negros não eram realmente buracos. Tudo culpa da fascinação que a extensa coleção de gibis que meu primo mais velho tinha em seu guarda-roupa me causava desde muito nova. Eu queria ler todos, t-o-d-o-s, e nem sempre tinha alguém podendo ler pra mim. Enquanto uma amiga teve que decorar o discurso que ela fingiu ler na formatura da pré-escola, eu já tinha pegado emprestadas várias daquelas histórias do armário do meu primo e, entre almanaques da Turma da Mônica e revistinhas raras de uma promoção de algum refrigerante do começo dos anos noventa, eu encontrei aquele livrinho.

Não era um gibi. Não era historinha. Era sobre outros mundos suspensos com um pano de fundo preto cheio de glitter ao longe e como eles giravam incansavelmente em torno de uma bola brilhante. E como esses mundos, em sua maioria, também tinham outras bolinhas dançando em volta deles. O tempo todo. Pra sempre. E não era ficção.

Logo de cara meu planeta favorito do sistema solar era Netuno. Não tinha porque gostar mais de outro. Essa escolha me acompanhou até a segunda série, quando todo mundo decidiu que gostava mais de Júpiter, porque era o maior. Ou de Saturno, porque tinha aqueles anéis ostensivos. Mas Netuno também tem anéis. Eles são só mais finos e demoraram mais para serem descobertos porque era difícil de enxergar. Netuno – naquela época, em que Plutão ainda era planeta (e, convenhamos, sempre vai ser) – tinha essa outra particularidade de se tornar o último planeta do sistema solar por um tempo, quando sua órbita cruzava a de Plutão. Ele era retratado no livrinho como um planeta azul, o que era maravilhoso pra essa garotinha que nunca gostou muito de rosa.

Eu li tantas vezes o livro inteiro pra ter certeza de que não tinha perdido nenhuma informação que ele acabou se tornando mais uma de minhas posses. Não lembro agora se meu primo me deu ou se, por convenção, ele acabou nunca mais o pegando de volta por saber que eu ia emprestar de novo. Netuno, esse planeta estranhão que gosta de ficar no fundo da sala, sozinho por um tempo, pra depois voltar a se misturar à galera, diz um tanto sobre minha vida e personalidade, no fim das contas. Na minha cabeça, Urano era irmão dele, esse planeta peculiar que gira de lado e tem anéis inclinados por conta da sua polaridade diferente. Um gênio incompreendido. Que família.

Mas, ainda assim, é melhor que ser Júpiter, que parece posar de super bem-sucedido do rolê só porque é o maior de todos. Mal sabem eles que Júpiter deveria ser estrela, tinha todos os elementos necessários, mas falhou em crescer o bastante na hora que deveria.

Às vezes ele é visto fazendo bicos de coadjuvante nos megaproduzidos espetáculos de Saturno.

- 2016

quinta-feira, 3 de março de 2016

Sem Limites

Quando a saudade aperta,
a gente sabe que é hora.
Quando a solidão aperta,
a gente sabe que é hora.

Quando o silêncio sufoca,
quando o amor demora…
Quando o mar nos leva
a gente sabe que é hora.

É hora de voltar
quando nada nos resta
quando já é fim de festa
quando a maré sobe
e o mar nos leva

É hora, para quem tem casa,
tornar.
Para quem tem mala,
viajar.

Menos eu.
Eu não tenho para onde voltar.
Eu só sigo em frente.

- 2013