Se não me
engano, é lá pela segunda série que começamos a aprender sobre o sistema solar
na escola. Enquanto os colegas sequer sabiam que planeta vinha antes da Terra
na escala de proximidade do Sol, eu já sabia que formatos as galáxias podiam
ter, o que acontecia quando uma estrela virava supernova e por que buracos
negros não eram realmente buracos. Tudo culpa da fascinação que a extensa
coleção de gibis que meu primo mais velho tinha em seu guarda-roupa me causava
desde muito nova. Eu queria ler todos, t-o-d-o-s, e nem sempre tinha alguém
podendo ler pra mim. Enquanto uma amiga teve que decorar o discurso que ela
fingiu ler na formatura da pré-escola, eu já tinha pegado emprestadas várias
daquelas histórias do armário do meu primo e, entre almanaques da Turma da
Mônica e revistinhas raras de uma promoção de algum refrigerante do começo dos
anos noventa, eu encontrei aquele livrinho.
Não era um
gibi. Não era historinha. Era sobre outros mundos suspensos com um pano de
fundo preto cheio de glitter ao longe e como eles giravam incansavelmente em
torno de uma bola brilhante. E como esses mundos, em sua maioria, também tinham
outras bolinhas dançando em volta deles. O tempo todo. Pra sempre. E não era
ficção.
Logo de
cara meu planeta favorito do sistema solar era Netuno. Não tinha porque gostar
mais de outro. Essa escolha me acompanhou até a segunda série, quando todo
mundo decidiu que gostava mais de Júpiter, porque era o maior. Ou de Saturno,
porque tinha aqueles anéis ostensivos. Mas Netuno também tem anéis. Eles são só
mais finos e demoraram mais para serem descobertos porque era difícil de
enxergar. Netuno – naquela época, em que Plutão ainda era planeta (e,
convenhamos, sempre vai ser) – tinha essa outra particularidade de se tornar o
último planeta do sistema solar por um tempo, quando sua órbita cruzava a de
Plutão. Ele era retratado no livrinho como um planeta azul, o que era
maravilhoso pra essa garotinha que nunca gostou muito de rosa.
Eu li
tantas vezes o livro inteiro pra ter certeza de que não tinha perdido nenhuma
informação que ele acabou se tornando mais uma de minhas posses. Não lembro
agora se meu primo me deu ou se, por convenção, ele acabou nunca mais o pegando
de volta por saber que eu ia emprestar de novo. Netuno, esse planeta estranhão
que gosta de ficar no fundo da sala, sozinho por um tempo, pra depois voltar a
se misturar à galera, diz um tanto sobre minha vida e personalidade, no fim das
contas. Na minha cabeça, Urano era irmão dele, esse planeta peculiar que gira
de lado e tem anéis inclinados por conta da sua polaridade diferente. Um gênio
incompreendido. Que família.
Mas, ainda
assim, é melhor que ser Júpiter, que parece posar de super bem-sucedido do rolê
só porque é o maior de todos. Mal sabem eles que Júpiter deveria ser estrela,
tinha todos os elementos necessários, mas falhou em crescer o bastante na hora
que deveria.
Às vezes
ele é visto fazendo bicos de coadjuvante nos megaproduzidos espetáculos de
Saturno.
- 2016